Recentemente foi comemorado o Dia Municipal do Voluntário em Ribeirão Preto. E em meio aos horizontes da cidade, há mãos que se estendem, dia e noite, na direção do sofrimento. Em todos os lados, pessoas do bem deixam pegadas luminosas. Uma dessas boas almas é Marcia Pieri, hoje à frente do Programa De Mãos Estendidas – voltado ao amparo de mulheres vítimas de violência. Segundo ela, o interesse em ser voluntária da paz, do amor e da concórdia surgiu de forma natural. - “Eu nunca vivi na miséria. Pelo contrário, sempre morei bem, estudei em escolas particulares, fiz cursos de música, depois faculdade. Mas acabei deixando meus sonhos de lado quando vi pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, sem perspectivas de uma vida digna. Recordo-me, por exemplo, quando ao visitar uma comunidade pela primeira vez, com o objetivo de realizar uma festa natalina para cerca de 800 crianças, vi coisas capazes de sensibilizar até o mais frio dos homens. Notei pessoas dormindo em sofás surrados, utilizando tocos de madeira como fogão, ou crianças brincando com insetos no esgoto a céu aberto”, explicou.
E pensar que um dia Márcia Pieri ouviu de outra pessoa: - “Não consigo entender porque você trabalha ajudando as mulheres em situação de violência quando não vive na pele nenhuma violência doméstica.”
Tal comentário a fez pensar sobre a falta de empatia no mundo e de recordar novas cenas durante o tempo em que atendeu na comunidade.
- “Bem antes do Programa de Mãos Estendidas ser criado, quando eu já era voluntária naquela comunidade, vi pessoas comendo raspas de comida velha, grudada no fundo da panela. Gente nossa dividindo espaço com ratos. Um deles, inclusive, pulou em mim. Isso sem contar crianças espancadas e lágrimas que desciam daqueles rostinhos inocentes. Cada dia eram cenas de horror que me tocavam sobremaneira. Porém a pergunta que faço é: Porque é que quem nunca passou fome não tem legitimidade para nutrir alguém? E porque quem nunca sofreu violência doméstica deve ficar insensível ouvindo notícias que a cada 7 horas uma mulher morre vítima de feminicidio no Brasil?”, questionou.
Foram tantas e amargas vivências, que desde então, ela não poderia ficar inerte. Fisgada por Jesus, o pescador de homens, Márcia Pieri acionou o “modo descanso” de seu escritório de advocacia, voltou à comunidade onde atuou por onze anos e fundou, ao lado de sua família, o Programa de Mãos Estendidas (www.programademaosestendidas.com).
- “Certa vez ouvi uma frase que explica tudo: - ‘O que nos falta é a alegria dos outros’. Por isso fazer o bem é tão gratificante. Quando praticamos o bem, sentimos a alegria dos outros e aquela energia consoladora nos toca profundamente”, ressaltou a voluntária Márcia Pieri, que busca seguir as pegadas luminosas deixadas por Jesus.
Ela lembra que, desde que decidiu por fundar a ONG, houve empatia entre a família dela e a comunidade.
- “Quando estávamos juntos havia prazer e satisfação, ainda que a realidade social fosse de total escassez”, lembrou.
A adepta do bem lembra que o sofrimento do mundo não deixa de ser um convite para que as pessoas de bem decidam agir:
- “Até hoje coordeno os projetos sociais de assistência às mulheres em situação de vulnerabilidade social (dentro do cárcere e fora). E, depois de atuar naquela comunidade com crianças e adolescentes, o foco atual é a atenção às mulheres, pois nossa organização acredita que quem cuida da mulher ampara a família inteira”, ressaltou Márcia Pieri.
O Programa de Mãos Estendidas, composto por voluntários e colaboradores, atua com atendimento, acolhimento, entrevista, escuta, encaminhamento, acompanhamento e o desejo de que as mulheres reconstruam suas vidas. E no dia a dia do projeto, o contato direto com relatos sobre sofrimento não permite que Márcia e os demais companheiros de luta fiquem de braços cruzados.
- “Muitas páginas seriam insuficientes para relatar todas as histórias de tristeza, sabendo que tudo que vi e ouvi, muitas das vezes junto com minha equipe, ainda é nada perto do que existe. O mundo precisa de empatia. Não é sobre salvar o planeta, mas sobre cada um fazer a sua parte. Quando somos empáticos, ajudamos nossas vidas, a vida dos outros e ainda promovemos mudanças sociais”, considerou, para finalizar em seguida: - “Como mudamos o mundo? Uma atitude real de carinho e amor de cada vez. E você não precisa ter nascido na miséria para fazer a diferença. Todos nós devemos aprender a olhar para baixo, cientes de que há muitas lágrimas que merecem ser enxugadas. E é justamente isso o que eu aprendi desde cedo. Se temos condições econômicas, devemos lutar por aqueles que não tem. É questão de humanidade e de amor ao próximo”, finalizou.
- Marcia Pieri Advogada Fundadora Associação Programa de Maos Estendidas Coordenadora de Projetos Social intra e extra muros.