Inteligência Artificial: Do Chatbot ao Agente Autônomo – Navegando pelos Desafios da Conformidade

MURILO DO CARMO JANELLI
19/05/2025 17h20 - Atualizado há 8 horas
Inteligência Artificial: Do Chatbot ao Agente Autônomo – Navegando pelos Desafios da Conformidade
Foto: Lucas Anjos

Lucas Anjos*

A Inteligência Artificial (IA) deixou de ser um conceito futurista para se tornar uma realidade presente e transformadora no mundo empresarial. Tecnologias computacionais inspiradas na cognição humana otimizam processos, personalizam interações e impulsionam a inovação numa vasta gama de setores. Ferramentas como o ChatGPT e Google Gemini democratizaram o acesso à IA Generativa (GenAI), e muitas empresas sentem a pressão de adotar essas tecnologias para manter a competitividade.

Contudo, essa corrida pela inovação levanta uma série de preocupações práticas para as organizações:

  • Como utilizar a IA sem violar a LGPD? Um novo chatbot de atendimento que lida com dados de clientes exige garantias de que o tratamento desses dados esteja em conformidade.
  • O conteúdo gerado por IA é seguro em termos de direitos autorais? Equipes de marketing que usam IA para criar textos e imagens precisam se certificar que não há violação de direitos de terceiros.
  • É possível confiar nas decisões automatizadas da IA? A utilização de IA na análise de currículos ou na aprovação de crédito requer mecanismos para evitar vieses discriminatórios e garantir tratamento justo.
  • Como estabelecer diretrizes internas para o uso da IA? Diante do uso espontâneo de ferramentas de IA por colaboradores, torna-se necessário definir regras claras para um uso ético e seguro em toda a empresa.

Embora a IA ofereça vantagens significativas, a falta de preparação para os seus desafios legais e éticos expõe as empresas a riscos consideráveis: incidentes de segurança, multas, danos reputacionais e perda da confiança dos clientes. Este artigo explora a evolução da IA, com foco nos agentes autônomos, e oferece orientações práticas sobre como navegar pelos desafios da conformidade, permitindo que as empresas inovem de forma responsável e segura.


Entendendo a Evolução: Dos Chatbots aos Agentes de IA

Para compreender os riscos e oportunidades associados à IA, é útil conhecer a sua evolução recente. Um exemplo claro é a transformação dos chatbots em agentes de IA.

O Início (LLMs Básicos): Inicialmente, as interações com “Grande Modelo de Linguagem” como as primeiras versões do ChatGPT eram pontuais, sem retenção de memória ou contexto entre as requisições. Exemplo: um chatbot simples que respondia a perguntas frequentes sem histórico da conversa.

Incorporação de Memória: Posteriormente, surgiu a capacidade de reter o contexto da conversa, permitindo diálogos mais fluidos. Exemplo: assistentes virtuais que acompanham o fluxo da interação com o cliente.

Acesso a Dados Externos (RAG): O passo seguinte foi dotar os agentes da capacidade de buscar informações em bases de dados externas, como documentos internos da empresa (PDFs, Excels), através de técnicas como o RAG (Retrieval-Augmented Generation). Exemplo: um agente que consulta o manual de um produto para responder a uma dúvida específica.

Interação com Ferramentas (APIs): A arquitetura evoluiu para permitir que os agentes utilizem ferramentas e se conectem a outros sistemas via APIs. Exemplo: um agente capaz não só de responder a perguntas, mas também de agendar uma reunião ou iniciar um pedido num sistema empresarial.

Sistemas Multiagentes e Feedback: A fronteira atual inclui agentes que aprendem com feedback e sistemas onde múltiplos agentes colaboram em tarefas complexas. Exemplo: um sistema onde um agente analisa dados de vendas, outro cria uma campanha de marketing baseada nessa análise, e um terceiro monitoriza os resultados.

Essa rápida evolução, embora traga capacidades avançadas, também aumenta a complexidade e os pontos de contacto com dados sensíveis e processos críticos do negócio, tornando a conformidade ainda mais essencial.


O Desafio Central: Garantir a Conformidade na Era da IA

A rápida adoção da IA, especialmente a generativa, levanta a questão central: a tecnologia está sendo utilizada da forma correta pelas empresas? Como garantir que a implementação respeita as leis e regulamentos aplicáveis?

A preocupação com a conformidade regulatória e o uso ético da IA é crescente e justificada. A implementação destas tecnologias envolve quase sempre o tratamento de grandes volumes de dados, que podem incluir:

  • Dados pessoais e sensíveis (protegidos pela LGPD).
  • Propriedade intelectual e industrial.
  • Direitos autorais (tanto no treino dos modelos como no conteúdo gerado).
  • Segredos comerciais e know-how empresarial.

Navegar neste cenário exige atenção a múltiplas legislações (LGPD, Marco Civil da Internet, Lei de Direitos Autorais) e a regulamentos setoriais ou específicos para IA que surgem no Brasil e globalmente. A falta de conformidade representa não apenas um risco legal, com multas e penalidades, mas também um sério risco reputacional.

Adicionalmente, a natureza de "caixa preta" de muitos sistemas de IA “As a Service” (oferta de soluções, ferramentas, sistemas e softwares baseados em IA em formato de serviços), dificulta a compreensão dos seus processos de tomada de decisão. Isso torna desafiante garantir a ausência de vieses, a segurança dos dados e a própria conformidade legal.


Por Onde Começar? Passos Essenciais para a Conformidade em IA

Diante deste cenário, a governança de IA torna-se fundamental. Não se trata apenas de cumprir regras, mas de incorporar boas práticas desde a concepção e desenvolvimento dos sistemas. Regulamentações globais e projetos de lei no Brasil (como o PL 2.338/2023) indicam alguns passos essenciais:

  • Realizar um Inventário do Uso da IA: O primeiro passo concreto é mapear onde e como a IA está sendo utilizada na organização. Isso inclui criar um registro das aplicações e das suas finalidades. Exemplo prático: Listar todas as ferramentas de IA em uso (desde chatbots até software de análise de dados) e os respectivos departamentos utilizadores.
  • Rever e Adaptar as Políticas de Privacidade e Segurança: É crucial entender como os princípios da LGPD (notificação, consentimento, finalidade) se aplicam ao uso da IA e atualizar as políticas existentes para cobrir estas especificidades. Exemplo prático: Verificar se a política de privacidade informa claramente os titulares de dados sobre o uso dos seus dados para treino de modelos de IA.
  • Definir o Contexto de Cada Caso de Uso: Para cada aplicação de IA, devem ser clarificados os objetivos de negócio, os dados envolvidos, os requisitos de desempenho e as considerações éticas. Exemplo prático: Ao implementar IA na análise de crédito, definir quais dados serão usados, como o desempenho será medido e quais salvaguardas existem contra discriminação.
  • Estabelecer Políticas e Procedimentos Internos: É necessário criar regras claras para todo o ciclo de vida da IA (aquisição de dados, desenvolvimento, teste, uso, monitoramento). A colaboração multifuncional entre departamentos (TI, jurídico, negócios) é essencial neste processo. Exemplo prático: Desenvolver um guia interno sobre o uso aceitável de ferramentas de IA generativa pelos colaboradores.
  • Manter Conhecimento Atualizado sobre Leis e Padrões: As empresas devem acompanhar a evolução das leis de proteção de dados, direitos do consumidor e regulamentações específicas de IA (como o AI Act da UE). Familiarizar-se com frameworks como os da OCDE ou NIST também é relevante. Exemplo prático: Designar responsáveis na equipe jurídica ou de conformidade para monitorizar as atualizações legislativas sobre IA.


Conclusão: Inovação com Responsabilidade

A jornada da Inteligência Artificial oferece um potencial transformador imenso para as empresas. No entanto, para colher os benefícios de forma sustentável, a governança de dados e a conformidade legal devem ser tratadas como prioridade máxima.

Iniciar com uma compreensão clara de como a IA é usada na organização, adaptar as políticas existentes e investir em conhecimento sobre o cenário regulatório são passos fundamentais. Agir proativamente não só mitiga riscos, mas também constrói confiança e posiciona a empresa para inovar de forma ética, responsável e em conformidade com a lei.

* Lucas Anjos é advogado no escritório Cerveira, Bloch, Goettems, Hansen & Longo Advogados Associados, pós-graduando em compliance, auditoria e controladoria pela PUC-RS, atuante no consultivo empresarial, proteção de dados e inteligência artificial. Certificado em LGPD pela IAPP -  International Association of Privacy Professionals. Membro da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial da OAB-SP.


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