Com a proximidade do segundo turno das eleições, crescem as polêmicas a respeito das pesquisas de intenção de voto.
No primeiro turno, a discrepante diferença de pontuação entre os percentuais dos candidatos que disputam o segundo turno chamou a atenção do eleitorado brasileiro.
Para esclarecer como são feitas as pesquisas e o que pode ter acontecido para que a maioria dos institutos de pesquisas se distanciassem tanto do resultado das urnas, entrevistamos Matheus Lemos Andrade, fundador da Jumppi Inteligência & Pesquisa.
A Voz de Ribeirão: Como são feitas as pesquisas de intenção de voto? Matheus Lemos Andrade: As pesquisas de intenção de voto são feitas a partir de questionários estruturados com perguntas fechadas. No que se refere a amostra, há a tentativa de garantir que as características do eleitorado sejam reproduzidas pela mesma, no que se refere aos critérios de sexo, idade, escolaridade/renda/classe social e região. Há pesquisas feitas por telefone e outras em pontos de fluxo, como praças, comércio, avenidas movimentadas e etc.
A Voz de Ribeirão: As entidades que realizam as pesquisas costumam abordar os entrevistados em todas as regiões do país ou em apenas na região de atuação do veículo? Matheus Lemos Andrade: Por obrigação elas precisam contemplar todas as regiões do país, quando se fala em uma pesquisa de âmbito nacional. Além disso, elas fazem a distinção entre a população residente nas capitais e cidades do interior dos estados. Este é um pré-requisito para que a amostra seja considerada representativa de todo universo da pesquisa (o eleitorado!)
A Voz de Ribeirão: Você acredita que uma parcela da população se influencia diretamente pelos resultados divulgados nas pesquisas eleitorais? Matheus Lemos Andrade: Sim. Certamente os resultados das pesquisas influenciam parcialmente nos votos dos eleitores inicialmente indecisos. Os fenômenos do “voto útil” e do “comportamento de manada” são exemplos da influência das pesquisas sobre o eleitorado.
O Voto Útil ocorre pela predisposição do eleitor a querer que os seus votos tenham uma influência direta nos resultados das eleições. Votar em um candidato que claramente não possui chances de vitória pode significar desperdiçar o voto (seria um voto inútil!). Isto ocorre principalmente em eleições majoritárias onde não há 2º turno, para eleições proporcionais ou no 2º turno das majoritárias. Neste ano, como o candidato Lula apresentava níveis de intenções de voto que estavam próximas a definir as eleições logo no 1º turno, buscou-se incentivar o voto útil a partir do argumento de que assim as eleições se definiriam mais rápido, evitando-se o 2º turno, e da rejeição a Bolsonaro, argumentando-se que seria uma ótima oportunidade de garantir a sua derrota.
O Comportamento de Manada ocorre quando indivíduos em grupo tendem a apresentar um mesmo comportamento. Como nem sempre as pessoas conseguem julgar se um determinado comportamento é desejável ou indesejável, se é correto ou errado, há uma tendencia de se comportar conforme os seus pares ou conforme as pessoas em seu entorno. Seria fruto do seguinte raciocínio: - “Se tanta gente está se comportando desta forma, é porque este é o melhor caminho!”. No caso das eleições, quando os resultados de uma pesquisa apontam para a liderança de um determinado candidato ou que muitas pessoas estão intencionadas a votar em alguém, o comportamento de manada pode ser acionado e criar uma pré-disposição a tal candidato. Os seres humanos têm dificuldade de fazer escolhas absolutas e a relativização das opções é um caminho que nos ajuda a decidir!
A Voz de Ribeirão: Acaso houvesse algum tipo de proibição de divulgação de pesquisas de intenção de voto você acredita que o resultado nas urnas poderia ser diferente? Matheus Lemos Andrade: Para a situação atual eu acredito que não. Mas principalmente no início das eleições eu penso que, caso as pesquisas tivessem captado que o percentual de votos em Bolsonaro estaria próximo à de Lula, acredito que os resultados poderiam ser outros, tanto para um lado, quanto para o outro. É impossível especular sobre qual foi a real influência da falha das pesquisas nos resultados das eleições, mas sabendo do voto útil e dos comportamentos de manadas, é plausível supor que houve sim alguma influência.
A Voz de Ribeirão: Você acredita que as pessoas mintam nessas pesquisas por temer julgamentos do entrevistador? Matheus Lemos Andrade: Não acredito que os entrevistados sintam constrangimento ou com medo de expor suas opiniões aos entrevistadores. Isso porque boa parte das pesquisas é feita por telefone, situação em que a possibilidade de constrangimento é reduzida. Além disso, os pesquisadores devem se apresentar de modo neutro e não podem verbalizar ou aparentar qualquer tipo de preferência. Por exemplo, nestas eleições eu desaconselharia os pesquisadores a usar as cores vermelho, verde e amarelo. Além disto, não considero que os cidadãos se sintam intimidados pela figura do pesquisador. Os pesquisadores são vistos como pessoas simples, trabalhadores que precisam da boa vontade do entrevistado. Nesta situação, não me parece que a intimidação seja uma possibilidade plausível para explicar os erros das pesquisas neste ano.
Acredito que os erros se deram a partir da simplificação dos processos amostrais, pela falta de rigor nos processos de verificação e checagem das entrevistas, pela falta de informações sobre o eleitorado em função da falta de um censo atualizado, principalmente no que se refere ao dimensionamento dos evangélicos entre a população e pela dificuldade de as pesquisas acessarem a população do campo.
A Voz de Ribeirão: Qual a real utilidade das pesquisas de intenção de voto, ante a previsão constitucional do voto secreto? Matheus Lemos Andrade: As pesquisas são excelentes instrumentos de diagnóstico e planejamento. Servem para identificar públicos com maior aderência ou rejeição a cada candidato. Permitem testar discursos e propostas que serão incorporadas nos planos de governo. Sem informação é impossível coordenar uma campanha eleitoral com assertividade.
A pesquisa é um instrumento de exercício democrático à medida que permite aos partidos e candidatos identificar as principais dores, demandas e opiniões do eleitorado. Assim os candidatos e partidos podem estabelecer seus planos de governo conforme o desejo de cada estrato da população. Acredito que as pesquisas não ferem o direito de voto secreto uma vez que elas não permitem a divulgação das respostas de cada indivíduo entrevistado. O código de ética dos institutos de pesquisa segue os padrões da LGPD protegendo os respondentes para que não sejam identificados e sofram qualquer tipo de retaliação em função de suas declarações. Além disso, a concessão de uma entrevista é um comportamento voluntário, ou seja, o respondente não pode ser intimidado ou coagido a responder. O voto secreto é um direito, mas não uma obrigação!